quarta-feira, 27 de abril de 2016

Depois de Ver... A Saída do Paraíso.

Há um certo simbolismo na história bíblica de Adão e Eva. Eles foram expulsos do paraíso por saber. Isso mesmo, por saber. Então, de algum modo a religião cristã encara o saber como algo negativo, como o mal.
Qual é o mal de saber? Qual o problema em saber, que fez Deus os renegar apenas por terem adquirido conhecimento?

O saber sempre foi visto como uma poderosa arma, desde o início dos tempos. O conhecimento sobre o meio, sobre si e sobre o outro, proporciona de maneira singular a divisão da sociedade, desde os primórdios. É fato que aqueles que detiveram primeiro domínio (leia-se conhecimentos) sobre o fogo, tiveram vantagens na sobrevivência no mundo pré-histórico.

A questão chega quando o conhecimento passa de apenas uma vantagem, para ser uma ferramenta da opressão. O que o opressor menos espera é que o oprimido saiba. Não querem nem ao menos que saiba que é oprimido. Este conhecimento por si só, já gera um descompasso na hierarquia.

Somos todos Adão’s e Eva’s, sendo expulsos do paraíso que é a infância, quando passamos a conhecer. E passamos a ter a ciência do bem e do mal, quando perdemos a inocência, comum da idade, tudo ganha mais e mais sentidos. A partir daí, nada será como antes.

Somos tirados do conforto de um mundo conhecido, calmo, pragmático e simples. E jogados no olho do furacão, nas inquietações causadas pelo conhecimento. Se é lançado a um infinito de dúvidas, de incertezas, em um mar de agonias onde cada saber, gera uma imensidão de possibilidades.

Porque o conhecimento liberta. Mas além disso ele nos responsabiliza por nossos atos, pelas consequências dele. E quase nunca é confortável ter escolhas a mão, ter responsabilidades. É muito mais fácil ser guiado, ser ovelha.

Na Alegoria da Caverna, Platão observava o quanto era cômodo se manter com seus velhos conceitos, se manter preso de frente para a parede apenas tentando interpretar as imagens do mundo lá de fora. E mostrava o quanto é difícil se encaixar nos moldes anteriores pré-estabelecidos, quando se expande seu próprio mundo. Ou seja, o quanto é difícil conseguir acesso de volta ao “paraíso” da caverna, quando conhece a realidade e faz uma leitura mais próxima do mundo.

Mas engana-se quem considera os livros como a única fonte de saber. O Paulo Freire, já falava que a leitura do mundo é tão ou mais importante que a leitura das palavras. É preciso experiência dos mais diversos olhares e nuances do mundo e agir de forma ativa, reflexiva e crítica para com este conhecimento.


As “imagens” criadas pelas culturas e informações que recebemos durante toda a vida é tão mais cômoda e simples. E não é fácil romper com estes velhos paradigmas, pessoais e sociais com os quais lidamos diariamente. É preciso ter coragem e boa vontade para sair do paraíso, é preciso coragem para crescer.

quinta-feira, 14 de abril de 2016

Depois de Ver... Que Somos 8 Bilhões de Pequenos Samarcos no Mundo

Longe de mim querer reduzir ou se quer minimizar os danos causados por esta terrível catástrofe. Mas o dano causado ao meio ambiente, diariamente, por cada um de nós é tão alarmante quanto.

Por ter sido um estrago tão grande de uma só vez, acabou causando esta impressão e nos mostrou o grande impacto causado. Porém, todos os dias fazemos negligências de forma consciente e inconsciente que são responsáveis por prejuízos consideráveis ao planeta.

Somos uma espécie devoradora do ambiente em que vivemos. Em nome do comodismo e do capital, insistimos em utilizar e explorar recursos naturais não renováveis, que até possuem outras alternativas, com a “desculpa” de que o desenvolvimento é mais importante.

O egoísmo e egocentrismo humano é tanto que não conseguimos pensar nem em nossos próprios filhos e descendentes. Tudo baseado na premissa do lucro e do conforto. Isso sem falar no discurso de (quando der problema eu resolvo).

É fato que somos seres de extraordinária capacidade de adaptação, mas nada justifica os danos que causamos ao planeta. Conforme pesquisa realizada na Universidade da Georgia, por Jenna Jambeck, anualmente são despejadas 8 milhões de toneladas de resíduos plásticos nos mares em todo o mundo. E não é preciso nem dizer quanto impacto o plástico causa a natureza, nem quantos anos um plástico leva para se decompor.

Literalmente defecamos todos os dias em água potável, que representa apenas 3% da água disponível no mundo. A geração de detritos e resíduos tóxicos são de volume descomunal. E ainda assim nos é difícil pensar em alternativas mais ecológicas.

Alteramos a fauna, a flora, tanto terrestre quanto marinha, alteramos a atmosfera, poluímos e alteramos até o espaço, com a maciça quantidade de lixo espacial.

Mas esta negligência ultrapassa a falta de cuidado com o planeta, que parece algo tão grandioso para ser impactado por aquele papel de bala que voa pela janela do carro. Esta negligência chega ao nosso próprio corpo, quando somos incapazes de cuidar da própria saúde, de se importar com os outros e o meio, colocando os ganhos financeiros e pessoais acima de qualquer outra coisa.

Não costumamos pensar que nossas pequenas ações podem ter grandes impactos no mundo. Ainda somos tão pequenos e mesquinhos, que não conseguimos ver que somos a turma do Capitão Planeta às avessas, no qual a união de nossas, aparentemente mínimas, agressões pode ferir bastante o planeta. É o papel de bala na rua, a árvore cortada na frente de casa, é comer um simples bife, é utilizar combustíveis fósseis...


Com certeza já passou da hora de revermos nosso conceito de sociedade e buscarmos meios mais harmônicos de convívio com o meio. Pois se continuarmos nos moldes atuais, não sobrará muito do mundo para consumir.

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Depois de Ver... Minorias

Era festa de final de ano na empresa, uma financeira, e resolveram passar um belo e inspirador vídeo institucional da Coca-Cola, feito no Brasil e com atores brasileiros. O vídeo conta a história de uma pequena cidade que está com a ponte quebrada e como os moradores se unem para reconstruí-la.

Olhando ao redor naquela sala repleta de gente que assistia o vídeo, emocionados, percebi nos olhos deles o sentimento, eles se viram ali, representados na telinha por atores globais. Se viram unidos, juntando forças para construir uma ponte de possibilidades. Após isso, o Papai Noel, sorrisos, a festa, mais sorrisos. Todos naquela sala se viam ali. Mas eu não.

Lembrei que somos um país com maioria negra/parda. Mas que esta distribuição não alcança diversos setores. Olhei para os lados e em meio a mais de 100 pessoas e me vi sendo o único negro da empresa. Mas vi a cozinha cheia, os garçons que passavam por mim. Me identificava muito mais com eles. Era onde estavam mais iguais.

Não somos minoria! Segundo dados do IBGE de 2013 a população preta e parda (autodeclarados), já corresponde a 53% da população brasileira. E é bem provável que essa relação tenha aumentado nos dois anos seguintes.

Mas ainda somos minoria, nas faculdades, nos altos cargos do governo e empresas, na política, em cargos ditos elitizados (médicos, advogados). E não somos minorias nos presídios, nas estatísticas de mortos, nas favelas, nas taxas de analfabetismo, nas comunidades em vulnerabilidade social, nas vítimas de homicídio...

Por que somos maioria e ainda assim somos estigmatizados? Por que nas posições privilegiadas da sociedade ainda é de maioria branca?

A resposta está na história, no processo de abolição, que nos tornou livres, mas não deu, estrutura, direitos, dignidade. Está no preconceito, velado e até muitas vezes escancarado que sofremos, sendo medidos por nossa aparência em detrimento a nossas capacidades. São as oportunidades que nos faltam, as portas que são fechadas por nossa cor.

Ainda que a relação entre brancos e negros/pardos no Brasil, demonstre uma maioria de afro descendência, o negro continua sendo o oprimido por aqui. É a esmagadora maioria, embora sejam minoritários na sociedade.

Ainda assim a TV teima em fazer uma TV que não é para mim, que não me é semelhante. E quando o faz, estão em posição de vulnerabilidade. Como se a única opção possível de ser negro seja a do nordestino fugindo da seca, o ladrão, o malandro, o empregado, o amigo pobre do filho do protagonista.

Somos um pais de maioria preto/pardo que tem medo de mostrar que somos negros/pardos. Aceitamos o imigrante europeu que vem, muitas vezes, para a exploração sexual da brasileira, mas não aceitamos o refugiado Haitiano que vem em busca de uma vida melhor.

É importante também não generalizar, há sim negros no poder, há negros na TV em posição de destaque, a questão é que esta proporção não é a mesma da sociedade, e o mínimo que se espera é uma semelhança entre estas grandezas. Lembre-se também que não são todos os brancos opressores, mas vale ressaltar que a sociedade o é. E assim, torna opressor quem, como o negro que consegue uma posição na elite e renega ou se envergonha de sua origem. E isso se percebe de forma sutil, é no alisar dos cabelos por exemplo.

Apesar de achar importante e até desejar isso, não espero que a Coca-Cola faça um comercial brasileiro, com todos os personagens negros, também não seria justo. Mas o mínimo que esperava é que a metade daquele elenco tivesse a minha cor. Assim, quem sabe, pudesse ser tocado pelo comercial como meus colegas foram.

A diferença entre maioria e minoria é grande, mas a linha entre maioria e minoria opressora é tênue. A opressão está impregnada na sociedade. E o negro que consegue acender socialmente tem que parar de ter vergonha da sua cor, da sua origem. E quando diretores, empresários, proprietários, passarem a dar a seu semelhante, a oportunidade que muitas vezes lhe faltou.




“Chegou a hora dessa gente bronzeada mostrar seu valor” (Os Novos Baianos)