Final de tarde, Raul e Gabriel
andavam pelo centro em silêncio. A intimidade da amizade dos dois permitia o
silêncio sem os deixar desconfortáveis. Foi o Raul quem quebrou o silêncio:
- Ontem quando cheguei em casa
tinha uma caixa com um gato dentro bem na minha porta.
- O que?
- Ontem quando cheguei em...
- Não, isso eu ouvi. –
Interrompeu Gabriel - Mas como assim?
- Tinha uma caixa no chão, bem na
frente da porta, acho que tem um gato dentro.
- Vivo?
Olhando para cima como se
pensasse com seus botões, Raul respondeu:
- Não sei.
- Como não sabe? – A pergunta
veio com um tom de leve irritação, que
logo foi controlado.
- Não abri para ver.
- Mas... Como assim não abriu?
- A caixa tá lacrada. – Raul deu
de ombros, como se fosse a resposta mais obvia. - Nem dá pra ver o que tem dentro.
É meio pesada e quando balanço não faz barulho nenhum. Eu é que não vou abrir.
- E como é que você sabe é um
gato?
- Sei lá. Eu acho que é.
- Então abre a caixa, horas. Vai
deixa o pobre do gato morrer?
- Eu não. Vai que não é um gato.
É um tocador de fitas imitando o bicho ou uma pelúcia que faz aqueles
barulhinhos, sei lá não acho uma boa ideia abrir aquilo.
- Mas e se for um gato? O
coitado deve tá sufocando lá dentro.
O dono da caixa torceu a boca, constatando
o obvio que havia na lógica do amigo. Mas ainda assim teimou:
- Mas ai não é problema meu.
- Como não? Você é quem tem a
caixa, o gato tá dentro...
- Ou não, nunca se sabe. - Foi a
vez de Raul interromper
- Tá... Você é quem tem a caixa,
o gato "pode ou não” estar dentro – acentuou as aspas com um gesto de mãos
- então o problema é seu sim. E você só vai saber se ele tá lá se abrir. Você pode
tá matando o coitado.
- Calma ai, Gabriel. Alto lá! Matando
não. Quem fez isso foi o escroto que colocou, ou não, ele lá. E se for uma
armadilha? Ou se o bichano tiver mesmo morto? Vai subir aquele
cheiro, estragar com minha casa, vai demorar dias para sair.
- Então joga a caixa fora. Ou me
dá que eu abro. Você não vai olhar o que tem dentro mesmo. E se for algo
perigoso você já se livra.
- Só por que tu quer, que vou te
dar minha caixa. Se fosse para ser sua, tinham colocado uma na sua porta. Além
disso, eu gosto da caixa. É bonitinha, tem uns desenhos bacanas, combina com
minha mobília. Ah, e o barulho que faz é engraçado.
Gabriel deu um pequeno sorriso
com o comentário, a seu ver sem lógica, do amigo. E acrescentou:
- Sem comentários.
Definitivamente você é maluco. Eu definitivamente abriria a caixa na primeira
oportunidade.
- E eu sou o maluco? Você abriria
uma caixa misteriosamente colocada na sua porta sem pensar. E eu sou o maluco?
Os dois riram da situação e de
suas conclusões opostas e tão verdadeiras, e seguiram em silêncio. Nenhum dos
dois voltou a tocar no assunto da caixa e do gato morto-vivo, depois deste dia.
Porem antes dar o assunto por encerrado
de uma vez por todas Gabriel perguntou:
- E porque você acha que é um
gato mesmo?
- Por que mia.
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